O DIA EM QUE A SELVA S.A. DESCOBRIU QUE O BRASIL VIVE NO FUSO HORÁRIO DO “TÔ CHEGANDO!
Na Selva S.A., todos os animais viviam numa aparente ordem menos o relógio.
O tempo ali funcionava como no Brasil real:
– Marcava nove, mas começava nove e meia.
– A reunião era às dez, mas só começava quando a Onça aparecia dizendo:
“Calma, Leão… é que o trânsito tava impossível!”
Sim, até na selva existia trânsito. De cipó. De tartaruga. De formigas em greve. E de desculpas.
Mas a Diretoria da Selva S.A. decidiu investigar esse fenômeno depois que o Papagaio trouxe uma matéria do mundo humano dizendo:
- 36% dos brasileiros culpam o trânsito pelo atraso - Estudo da PUC-Rio, citado no O Globo
- 21% culpam telefonemas inesperados
- 14% dizem que foi imprevisto doméstico
- 12% assumem que perderam a hora
E para completar, o Macaco ainda achou outra pesquisa:
- 31% a 33% dos atrasos no mundo corporativo têm como causa “dormi demais” - Fonte: CareerBuilder USA
Pronto. Os animais ficaram em choque. O Leão convocou uma reunião imediata que, ironicamente, começou com 42 minutos de atraso.
Leão - O CEO da Selva S.A.
Rugiu irritado:
— “Companheiros, precisamos falar do atraso nacional! A Onça perdeu o horário da última reunião, o Papagaio chegou dizendo que o vento virou, e o Elefante disse que esqueceu o caminho, sendo que ele nunca esquece nada!”
Elefante - O da memória perfeita, mas seletiva
— “Leão, não esqueço mesmo... mas também não sou obrigado a lembrar de compromisso marcado às 8h!”
— “Além disso, li em uma pesquisa da UFRJ que o congestionamento urbano aumentou 27% em grandes capitais desde 2019. A culpa não é minha!”
(Fonte: Relatório do Observatório da Mobilidade Urbana – UFRJ, 2023)
Papagaio - O comunicador
— “Eu só repito o que vejo! E o que vejo é animal dando desculpa igual humano.”
— “No transporte aéreo, mais de 25% dos voos brasileiros tiveram atraso em 2023!”
(Fonte: ANAC – Boletim de Pontualidade 2023)
Macaco - O criador de desculpas oficiais
— “Olha, Leão, criatividade é o que não falta. Tem bicho dizendo que caiu do galho, que o cipó arrebentou, que o tucano sequestrou... Isso aí não é atraso, é talento!”
Raposa - A estrategista
— “O problema é cultural, Leão. Brasileiros e animais trabalham sob o tempo relacional. Entre ser pontual e parar para ajudar um amigo, escolhem o amigo.”
— “A antropologia chama isso de ‘flexibilidade temporal’.”
(Fonte: Roberto DaMatta, antropólogo brasileiro)
Tartaruga - A mais lenta e mais sincera
— “Eu assumo: eu sou lenta mesmo. Mas pelo menos digo a verdade…”
— “Se 12% dos humanos admitem que perderam a hora, eu sou desses aí!”
A plateia inteira caiu na risada.
Leão - Então bate a pata na mesa:
— “Basta! Atraso virou epidemia nacional e selvagem. Precisamos de soluções!”
O Debate: Por que o Brasil Atrasa?
Cada animal levantou a pata, a asa ou o focinho e anunciou sua tese:
Elefante (infraestrutura)
— “95 horas por ano é o tempo médio que o brasileiro perde em congestionamentos.”
(Fonte: TomTom Traffic Index 2023)
— “Com estradas ruins e transporte falhando, até uma onça chega atrasada.”
Papagaio (comunicação)
— “Metade dos trabalhadores não sabe planejar o próprio deslocamento.”
(Fonte: Instituto Locomotiva, 2022)
— “E metade dos que planejam… planeja mal.”
Raposa (cultura)
— “Bicho, o ‘chegar atrasado junto’ virou tradição social. Igual bater palma no parabéns.”
Macaco (comportamento)
— “Dados internacionais mostram que 27% das pessoas simplesmente acordam tarde.”
(Fonte: SleepFoundation, 2023)
— “O problema não é o relógio. É o hábito.”
Coruja (a sábia)
— “A pontualidade é o primeiro pilar da ética. Kant já dizia: agir de forma moral é agir como se sua conduta fosse lei universal.”
— “Se todo mundo atrasasse… ah, é verdade, já acontece.”
Depois de muita gritaria, o Leão concluiu:
— “O atraso não é só desculpa. É sintoma de um país inteiro desalinhado com o próprio tempo.”
E a Selva S.A. entrou no projeto: “Operação: Chegar na Hora Certinha” (que começou com 18 minutos de atraso, claro).
Análise por Antoniel Bastos
O atraso brasileiro é mais que hábito: é poesia trágica, é jeitinho institucionalizado, é cortesia que virou desleixo. O país se acostumou a flertar com o relógio como quem paquera o impossível: chega perto, promete, mas nunca cumpre.
O Brasil convive com o atraso como quem convive com uma goteira antiga incomoda, molha, estraga o teto, mas ninguém levanta para consertar. Preferimos culpar o trânsito, a chuva, o ônibus, a avó, o destino, o alinhamento dos planetas.
E assim seguimos... Um país que corre, mas não chega. Que marca hora, mas vive no talvez.
- Nietzsche dizia que “o que falta aos homens não é tempo, mas intensidade”.
- E falta ao Brasil a intensidade do compromisso.
- Pontualidade não é sobre relógio é sobre respeito.
- Respeito ao outro, ao coletivo, ao país que precisamos construir.
Enquanto a selva e os humanos não entenderem isso, continuaremos repetindo como mantra nacional:
- “Cheguei agora.”
- “Cinco minutinhos.”
- “Tava impossível.”
O atraso é o retrato de um país que ainda não acordou para si mesmo. E talvez quem sabe este seja o maior atraso de todos.
Antoniel Bastos - Presidente da Rede Incluir, jornalista (MTB 00375/RJ), escritor e coach em Desenvolvimento Humano. Pós-graduado em Marketing Digital, atua como Diretor de RH da ACIJA e Gestor de Relacionamento Estratégico do Grupo Tokke. Especialista em Diversidade, Inclusão e Comportamento Organizacional, dedica-se à transformação de culturas corporativas com uma abordagem humana e inspiradora.
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