Prata na Juba: a revolução 60+ e o apagão de gente na Selva S.A


Falta mão de obra no Brasil… ou falta ponte entre experiência, formação e trabalho decente? De 2010 a 2025, o país envelheceu, digitalizou-se, mudou leis previdenciárias e viu o mercado ficar mais complexo. A população 60+ explodiu e segue ativa: só entre 2012 e 2024, o número de brasileiros com 60+ cresceu 55,4%, e os que trabalham nessa faixa aumentaram 69%  hoje, os idosos já são 20% da população em idade ativa.  

Ao mesmo tempo, empresas relatam escassez recorde: em 2025, 81% dizem ter dificuldade para contratar. E mesmo com desemprego geral em 5,8% no 2º tri de 2025 (mínimo da série), postos seguem vagos. Paradoxo? Não: desalinhamento.

A roda de conversa na Selva S.A.

Leão (CEO) bate a pata no púlpito:
— A selva está grisalha e produtiva, mas as trilhas estão cheias de buracos. Se 81% não acham gente, não falta bicho: falta mapa

Coruja (Economista-Chefe) projeta gráficos nas pedras:
— O país envelheceu rápido e trabalha mais tempo. A Reforma da Previdência (EC 103/2019) elevou idades mínimas, com transição progressiva (em 2025: 59 anos mulheres/64 homens em regra de transição por idade). Resultado? Mais 60+ dispostos ou necessitados de permanecer ativos. 
— E atenção: no 2º tri de 2024, 39,5% dos que estavam fora da força de trabalho eram 60+; é um estoque de potencial que depende de saúde, acessibilidade e políticas de reinserção. 

Onça (RH) afia argumentos:
— A lacuna não é só técnica. O combo mais pedido junta soft skills (colaboração, resolução de problemas) com alfabetização digital. O problema é que muitas empresas ainda recrutam por diploma, não por competência demonstrável enquanto a tecnologia pede “tradutores” entre chão e nuvem. (E sim, a escassez segue em patamar alto desde 2022.)

Macaco (TI) pendurado no cabo de rede:
— O mundo é 4.0; o manual ainda é 1.0. A gente compra robô e esquece do treinamento. Falta programa sério de requalificação e trilhas para 60+ migrarem a tarefas de supervisão digital, qualidade, dados e atendimento especializado. (A PNAD mostra a força de trabalho crescendo e a participação reagindo pós-2020.)
Jabuti (Jurídico & Previdência) lento, certeiro:
— Com as regras de transição, ficar no trabalho é a realidade de muitos. Precisamos adaptar jornadas, ergonomia, teletrabalho parcial, além de combater etarismo. Caso contrário, vamos desperdiçar o ativo mais raro: tempo de experiência.

Arara (Comunicação & Cultura) colorida e direta:
— E as gerações novas? Dado oficial: em 2024, os jovens (18–29) reduziram desemprego e 53% já tinham carteira assinada mas a informalidade ainda é alta e muitos preferem autonomia/MEI e projetos. Em 2025, o Brasil abriu 1,4 milhão de pequenos negócios só no 1º tri; MEI lidera. A cabeça mudou: propósito, flexibilidade e múltiplas rendas. 

Formiga (Operações) com a planilha:
— Tradução em custo: vaga aberta + curva de aprendizado + retrabalho = dinheiro indo embora. Num contexto com 81% de escassez, o time-to-fill sobe e a produtividade cai. O barato de não treinar sai caro.

Beija-flor (Bem-estar) – leve, mas incisiva:
— Sem saúde mental e design de trabalho para diferentes idades, perdemos gente. Programas intergeracionais aumentam aprendizagem e reduzem conflito. Idade não é defeito; é biblioteca.

Frases-potência dos bichos

  • Leão: “Escassez não é falta de gente; é falta de ponte.”

  • Coruja: “Demografia é destino mas gestão é desvio de rota.”

  • Onça: “Contrate por competência, treine por futuro.”

  • Macaco: “Automação sem requalificação é desumanização.”

  • Jabuti: “Tempo de casa é capital, não passivo.”

  • Arara: “Carreira hoje é portfólio, não trilho único.”

  • Formiga: “Sem trilha de aprendizagem, a empresa atrofia.”

O que mudou (e o que não mudou)

Mudou

  • Perfil etário: 60+ cresceu forte e trabalha mais (69% a mais em 12 anos), tornando-se parcela relevante da PIA. 

  • Arranjos laborais: mais MEI e pequenos negócios, com ciclos curtos e autonomia. 

  • Preferências geracionais: jovens menos fiéis à CLT “raiz”, mais abertos a portfólios de renda.

Não mudou (o bastante)

  • Requalificação contínua e alfabetização digital para 60+ e para quem foi “atropelado” pela tecnologia.

  • Seleção por skills em larga escala e design inclusivo de jornada.

  • Integração entre política pública (saúde, mobilidade, crédito para requalificação) e estratégia empresarial.

Mini-painel de fatos (2010–2025)

  • Escassez de talentos empregadores que reportam dificuldade (Brasil): patamar elevado e persistente; 81% em 2025

  • Desemprego geral: 5,8% (2º tri/2025) mínimo da série PNAD Contínua. 

  • 60+ no mercado: população 60+ cresceu 55,4% (2012–2024); ocupação 60+ +69% no período; 60+ compõem 20% da PIA. 

  • Fora da força (2º tri/2024): 39,5% são 60+. 

  • Demografia & força de trabalho: participação voltou a crescer em 2024; ocupação estimada em 103,3 milhões

  • Juventude & vínculos (2024): desemprego jovem caiu para 14,3%; 53% com carteira; informalidade 44%

  • Empreendedorismo (2025): 1,4 milhão de pequenos negócios abertos no 1º tri; MEI lidera. 

  • Previdência: regras de transição elevam idade mínima gradualmente até 65 H/62 M; 2025 ajustado para 64 H/59 M na transição por idade. 

Análise final por Antoniel Bastos 

O Brasil não tem falta de mão; tem falta de mente. Envelhecemos sem manual, modernizamos por decreto e esquecemos de treinar o dedo que aperta o botão da máquina nova. Enquanto 81% dos empregadores gritam “não encontro gente”, a estatística sussurra que há milhões capazes de trabalhar, mas fora da fila certa, do ônibus certo, do curso certo. É um país que adora o brilho da inovação, mas tem preguiça do chão da escola e do chão da fábrica

O 60+ virou vilão de conversa de bar e herói silencioso da produtividade: cresce 69% em ocupação numa década, sustenta famílias, empreende, ancora equipes e ainda enfrenta a catraca do preconceito. Ao lado, jovens querem autonomia, MEI, propósito, múltiplas rendas; não é rebeldia, é sinal dos tempos. O erro é tentar empurrar todo mundo para o mesmo crachá de 1998. 

O que precisa mudar? Tudo que é intermediário: recrutamento por skills, trilhas de requalificação, ergonomia de tempo e espaço, metas para diversidade etária, incentivos que comprem aprendizagem contínua. Políticas públicas que conectem saúde, mobilidade e crédito à requalificação. Líderes que saibam ouvir e ensinar. Sem isso, vamos continuar discutindo “falta de mão de obra” quando, na verdade, falta obra na mão: projeto, plano, orçamento e data de entrega.

Frases que ficam:

  • “Não falta gente; falta ponte.”

  • “Automatizamos o processo e esquecemos de educar a pessoa.”

  • “Idade é biblioteca; quem fecha, perde o livro.”

  • “O futuro não é jovem ou velho é competente.”

Quando a Selva S.A. parar de procurar o funcionário pronto e começar a prepará-lo, o Brasil vira página. Até lá, seguiremos com vagas abertas, talentos fechados e um país de potenciais desconectados de sua própria potência.

Antoniel Bastos - Presidente da Rede Incluir, jornalista (MTB 00375/RJ), escritor e Coach em Desenvolvimento Humano (Universidade Anhanguera - SP). Minha expertise se estende ao Marketing Digital (Pós-Graduação Unisignorelli - RJ) , líder de iniciativas de Diversidade e Inclusão como Diretor de RH da ACIJA - Associação Industrial e Comercial de Jacarepaguá e Gestor de Relacionamento Estratégico do Grupo Tokke - Gestão de Qualidade de Vida. 

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