Pessoa com Deficiência: A Vaga Está Lá, Mas a Cidade Some no Caminho
Na floresta da Selva S.A., o Pombo do RH preparava mais um post para o LinkedIn da empresa:
“Temos vagas abertas para todos os perfis! Acreditamos na inclusão verdadeira!”
Enquanto isso, na trilha de barro que ligava a aldeia ao prédio da empresa, a Jacaré Arquiteta, usuária de prótese, travava na lama.
— “Como se chega a uma vaga sem calçada, sem sinalização, com ônibus adaptado que passa só de lua cheia?”, ela resmungava, tentando não escorregar.
Mais à frente, a Lontra Estudante, com baixa visão, tropeçava nos buracos da estrada:
— “A escola já não foi fácil... agora o emprego também é missão impossível?”
A Onça Auditora, com fones adaptados, comentou:
— “Falam tanto em inclusão nas empresas, mas e nas cidades? A Lei Brasileira de Inclusão fala em mobilidade urbana como direito, mas nas ruas da floresta... é cada um por si.”
O Camaleão Sociólogo, invisível aos olhos apressados, desabafou:
— “Sabe qual o maior inimigo da inclusão? O asfalto quebrado. A calçada sem guia. O ponto de ônibus sem rampa.”
Lá do alto, pousou a Coruja Urbanista, com um mapa da floresta e os dados do IBGE:
— “Menos de 30% das pessoas com deficiência estão no mercado de trabalho formal. Não porque faltam talentos, mas porque faltam acessos — físicos, políticos e simbólicos.”
— “Segundo o IBGE, pessoas com deficiência têm três vezes mais dificuldade de conseguir emprego. E 67% apontam a falta de acessibilidade urbana como principal barreira.”
(Fonte: G1/Jornal Nacional, 2023)
A Girafa Planejadora Urbana gritou de longe:
— “E onde estão os governos municipais e estaduais nessa história? O transporte é precário, o espaço público é agressivo. Cadê a fiscalização? Cadê o investimento em acessibilidade urbana?”
A Tamanduá da Transparência Pública apareceu com um relatório nas costas:
— “Só 6% dos municípios brasileiros têm plano estruturado de acessibilidade urbana. A maioria cumpre tabela — quando cumpre.”
E o Gavião Vereador, do alto do seu galho político, ensaiava:
— “Vamos criar um comitê para estudar a situação da trilha!”
A Formiga Trabalhadora, já exausta, gritou:
— “A gente não precisa de estudo, precisa de asfalto!”
No canto da cena, a Capivara observava:
— “Dentro das empresas, a gente treina, adapta, acompanha. Mas fora dos muros... quem acolhe? A floresta não é só RH. É rua, é rampa, é governo.”
Falas potentes da selva:
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“A inclusão termina onde começa a calçada quebrada.” — Jacaré
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“Cidade que não acolhe, demite antes do crachá.” — Lontra
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“A rampa na empresa não compensa a ausência de ponte na cidade.” — Coruja
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“Sem acessibilidade pública, a lei de cotas é letra morta.” — Girafa
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“A floresta quer parecer moderna, mas vive cercada de raízes velhas.” — Camaleão
Análise final – por Antoniel Bastos
Vivemos em um país onde se exige que a pessoa com deficiência seja resiliente, guerreira, forte...
Mas o asfalto é um campo de batalha. A calçada, uma armadilha. E o ônibus adaptado, um mito contado na estação.
Falam de empregabilidade, de inovação, de ESG, de cota... Mas como cobrar inclusão no setor privado quando o setor público sequer oferece acesso básico à rua?
A cidade exclui antes do RH entrevistar. O Estado some antes da empresa contratar. E a dignidade se esfarela entre buracos, rampas improvisadas e placas que não levam a lugar algum.
As empresas tentam fazer sua parte. Mas como cobrar da Selva S.A. se o problema começa na esquina da floresta?
Governos municipais e estaduais continuam ausentes. Os projetos de acessibilidade viram estudo, os estudos viram relatório, os relatórios viram silêncio.
A lei existe, mas não anda.
O direito está escrito, mas não chega.
A vaga está lá.
Mas se a cidade não aparece no caminho, a oportunidade vira miragem.
Inclusão urbana não é detalhe. É o começo de tudo.
Antoniel Bastos - Presidente da Rede Incluir, jornalista (MTB 00375/RJ), escritor e Coach em Desenvolvimento Humano (Universidade Anhanguera - SP). Minha expertise se estende ao Marketing Digital (Pós-Graduação Unisignorelli - RJ) , líder de iniciativas de Diversidade e Inclusão como Diretor de RH da ACIJA - Associação Industrial e Comercial de Jacarepaguá e Gestor de Relacionamento Estratégico do Grupo Tokke - Gestão de Qualidade de Vida.
O capacitismo atrapalha na empregabilidade, pois inconscientemente desqualifica-se, duvidando das habilidades da pessoa com deficiência.
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