Crônicas da Selva S.A - A Vaga que Abre e Nunca Fecha


Na clareira da Selva S.A., os animais estavam inquietos. Não era por falta de comida ou por disputa de território era algo mais misterioso, quase invisível: as vagas que aparecem, mas nunca se ocupam.

O Tamanduá olhava os troncos com melancolia:

— “Dizem que há trabalho por todo lado, mas quando boto o focinho, dizem que não é pra mim.”

O Macaco, já cansado de pular de galho em galho, reclamava:

— “Querem alguém que voe como a Águia, pense como a Coruja, corra como a Onça e custe como uma Formiga. Só se for um animal mitológico!”

A Raposa, experiente nas entrevistas da selva corporativa, gargalhava:

— “Fui rejeitada porque tenho ‘perfil incompatível’. E olha que só me pediram experiência, inglês fluente, criatividade, resiliência, e salário de esquilo!”

O Galo, que só canta cedo e é pontual, chegou revoltado:

— “Fui chamado pra dez entrevistas. Em todas, me disseram que ‘faltava algo’. Faltava o quê? Um rabo novo? Um bico mais moderno?”

A Águia, que observa tudo de cima, fez sua análise:

— “Criaram vagas como se criam ilhas no meio do mar. Estão lá. São reais. Mas poucos têm o barco pra chegar nelas.”

O Búfalo, sempre firme, bradou com seu peso de verdade:

“Vaga que não fecha é como sombra sem corpo: só confunde quem procura luz.”

O Mistério das Vagas que Ninguém Ocupa

Na Selva S.A., há milhares de vagas abertas. E também milhões de animais sem ocupação. O que não fecha é essa conta.

Mas eis a verdade que poucos têm coragem de dizer:

  • As exigências são irreais: querem recém-nascidos com 10 anos de experiência.

  • As entrevistas são rituais de exclusão: não se avalia talento, mas capacidade de performar um personagem.

  • As empresas têm medo de treinar: preferem contratar o "pronto" (que não existe).

  • O preconceito fala alto: idade, origem, aparência, tudo vira filtro disfarçado.

  • O RH virou algoritmo: quem não tem palavras-chave no pelo é descartado antes do rugido.

Enquanto isso, o desemprego vira culpa do desempregado.

E os leões da gestão lavam as patas dizendo: “falta gente qualificada”.

Análise de Antoniel Bastos: “O Brasil das Vagas Fantasmas”

Se Arnaldo Jabor estivesse vivo, diria:

“Vivemos num país onde se cria a ilusão da oportunidade pra disfarçar o fracasso da inclusão.”

O Brasil tem 8 milhões de desempregados. E mais de 500 mil vagas abertas. Isso é estatística com gosto de tragédia.
É como ter comida na floresta e deixar os bichos morrerem de fome porque exigem que eles saibam cozinhar em francês.

As vagas não são apenas números são sintomas.
De um mercado de trabalho que exige demais, acolhe de menos, e forma quase nada.
Faltam pontes. Sobra arrogância.

 

Não é apagão de mão de obra. É cegueira de quem só enxerga currículo e não vê potência.
A selva grita por coerência.
Mas enquanto os chefes falam de inovação, o chão da floresta seca de tanto talento desperdiçado.

E foi o Tatu, que cava mas nunca aparece, quem disse baixinho antes de sumir na terra:

“Se tem tanta vaga e tanta gente, talvez o problema não esteja nem na vaga, nem na gente… mas no buraco entre elas.”

Fica o eco. Fica a crônica.
E na Selva S.A., como sempre, a verdade lateja onde ninguém quer encostar.

Antoniel Bastos - Presidente da Rede Incluir, jornalista (MTB 00375/RJ), escritor e Coach em Desenvolvimento Humano (Universidade Anhanguera - SP). Minha expertise se estende ao Marketing Digital (Pós-Graduação Unisignorelli - RJ) , líder de iniciativas de Diversidade e Inclusão como Diretor de RH da ACIJA - Associação Industrial e Comercial de Jacarepaguá e Gestor de Relacionamento Estratégico do Grupo Tokke - Gestão de Qualidade de Vida. 


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